Talvez a maior honra para um artista seja quando ele ou sua obra se tornam adjetivos. E muita gente, quando vai opinar sobre quadrinhos, diz que aquilo é “meio Angeli”, “tem um estilo Laerte” ou “uma faceta Glauco”. Os três paulistanos marcaram as HQs brasileiras. Não que isso fosse objetivo. Não que se importassem. Eles não queriam fazer arte, queriam destruir. E essa deliciosa anarquia transparece em Seis Mãos Bobas, republicação da Devir e da Jacaranda de parte do que o trio aprontou na década de 1980.
A galhofa começa pela capa e se espalha pelas várias ilustrações incidentais do álbum, que remetem ao ménage à trois quadrinístico. São 17 histórias curtas. Há crítica política, uma re-interpretação da História do Brasil e uma homenagem ao Henfil. Mas o melhor é o niilismo que permeia todas elas. Ser engraçado e pronto. A boa e velha sacanagem.
Passando por todas, a impressão que fica é que Glauco funcionava como o grande bolador de piadas, o responsável pelo caos criativo. Laerte era a reserva técnica, o que mais desenha e tem o melhor storytelling – vide a cena e atropelamento em Lingérie. E Angeli era o ponto médio, costurando os outros dois, com seu jeito resmungão punk. Parte da impressão é comprovada com A história das histórias, pequenos comentários sobre a criação de cada uma.
Who’s that Landão é uma fina experiência narrativa com fundo fixo; O Garoto da Capa subverte o sonho de qualquer adolescente; Cenas Censuradas da Reunião do Conselho de Censura sacaneia um problema que os três tiveram, e que felizmente ficou para trás; A história do sujeito que queria entrar pra História comenta como funcionam as coisas no Brasil, além de mostrar Angeli e Laerte versáteis no traço; e o último esculacha em O Míssil, história que destoa no álbum pelo teor.
Por mais que Angeli tenha resmungado, a homenagem ao Henfil mostra o DNA dos três. Função que, como quem não quer nada, o trio exerce hoje em boa parte dos desenhistas do país. Passados quase 20 anos, o humor das histórias não envelheceu. Como se arte envelhecesse.
Seis Mãos Bobas tem formato 28x21 cm, 80 páginas em preto e branco e custa R$ 23.
Publicado originalmente no Sobrecarga em 29/05/06.
Esses bobos bem que podiam lançar um álbum conjunto com material novo...
terça-feira, 30 de maio de 2006
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